segunda-feira, 29 de junho de 2009

"Crianças"

E eles se olhavam com um deslumbramento incrível. Parecendo criança olhando a vitrine de uma loja de brinquedos. “Parecendo” é eufemismo. Eram mesmo duas crianças com um presente de natal. E fora de época ainda, uma vez que guardava uma natureza inesperada no presente. A regressão infantil dos apaixonados não assustava.

A regressão permanente dos que nunca vão crescer já havia se instaurado ha muito tempo naqueles dois. Já era incorrigível.


Os olhos eram reflexos dos dentes. Sempre expostos devido a um sorriso contínuo. Isso, é claro, quando não estavam presos nos longos beijos que embasbacavam velhinhas beatas à caminho da igrja. Como se elas, muito melhor que eles não soubessem do que se tratava. Seria muito triste se não soubessem. Chegar àquela idade sem viver isso alguma(s) vez(es) na vida era vegetar, não viver.


Andavam de mãos, braços e pernas entrelaçados. Descendo as ruas com a silhueta de um monstro de ficção científica. Mas ninguém tinha medo, porque era notável que eles andavam em uma outra dimensão e mal se davam conta nem mesmo dos olhos curiosos e reprovadores. Eles não estavam nem aí mesmo. E nem por aqui, agora. Ninguém sabe onde foram, ou se eram de verdade. Sumiram. Porque morrer, não morreram. Aquilo mesmo já era pular do precipício. De mãos dadas inclusive, e é claro também.


Talvez tenham se perdido em uma carta, numa lua, num filme, num sonho...



















Ou só fugido para um motel pelo caminho.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

Golpe de estado

Desconsiderando todos os avisos de perigo que gritavam nos seus ouvidos. Que alternavam entre gol de copa do mundo, loucos doido varrido, queda de precipício e barata voadora. Colocou um salto alto, aquela blusa que a deixava mais magra e a saia acima dos joelhos, a única do guarda roupa, ainda que escasso. Usou um o batom de ocasiões especiais, se deu ao trabalho de se maquiar, coisa que raramente fazia mesmo em dias de festa. Quando saiu da casa concluiu que não era ela que saía, era uma outra, totalmente montada, feita de peças que ela usava com moderação. Uma por vez. E mesmo assim, já se sentindo deslocada.


No caminho, silenciosamente, as duas discutiam, a que não saiu e a que passou pela porta de casa ainda há pouco. A primeira continuava gritando insistentemente. A outra se fazia de surda e planejava uma entrada triunfal, sorrindo meio de lado, por ter tomado o controle pelo menos por um dia...

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Ele

E com a brutalidade de um suspiro ele se pôs de pé. Não tinha mais o que fazer ali.
O que haveria de esperar ouvir naquele lugar, além de combustíveis para suas próximas insônias?

Na verdade neste exato momento começou a se questionar que diabos tinha ido fazer naquela alcova. Se sempre soube o que lhe poderia dizer. Que nem um fio de esperança nunca lhe deram, isso ele não podia negar. Mas não podia deixar de ir e com a mesma intensidade que sempre sentiu, a raiva foi aplacada pela apatia. Quase na verdade, não se podia dizer que era ou estava apático, mas não tinha brilho algum no céu que passava em curvas sob sua cabeça.

Mas sem ao menos saber, de fato, naquele momento conjecturou que o que sentia era maior que os dragões. Os sentimentos verdadeiros são maiores que as feras. Assim mesmo, sem sentido, ou melhor, sem lógica. Sem a mesma lógica dos loucos mas com sabedoria equivalente...

Havia concordado em chegar até ali sabendo perfeitamente o que ouviria e o que não conseguiria dizer. (os ensaios mentais de nada valeram, mas isso ele bem sabia também). E aí fica a bela questão da noite: Por quê, se já sabia? Por que sente se não merecem seus (agora sentidos) sentimentos? Por nada mesmo.
A correspondência na verdade é apenas um bônus de quem sente. O sentimento é por si só. Querendo ou não. Afinal são milhões e porque raios o raio haveria de cair no mesmo lugar em mãos opostas, sem contramão, com vaga livre e sem multas? Uma recíproca nunca é verdadeira. Ninguém sente igual. Mas para quem acredita em coincidências...

Respirou fundo, sutil como um furacão, o soluço que secaria por alguns segundos os olhos eternamente marejados. Olhou as flores que carregava. (rosas é claro, mais clichê que isso impossível, mas sentimentos também são clichês, sempre são). E saiu por aí distribuindo as rosas para quem cruzasse seu caminho. Esperando deixar com elas um pouco de seus sentimentos transformado nos sorrisos dos presenteados. Afinal, enfim, o destino de todo sentimento é circular entre as lágrimas e os sorrisos dos quais são feitos.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Acordando (soneto despertador)

Viver passando em caminhos sinuosos

Olhando os outros pássaros que não voam para o sul

Tentando dizer mais que por favor, com licença e obrigado

Inventando palavras mais mágicas que o som


Chorando chuva ácida em lágrimas répteis de tão repetidas

Rindo tão alto quanto o que a platéia acha conveniente.

Sendo convencido à sombra de infelicidades seguras.

Achando a tristeza tão comum e simples, quanto inerente.


Mas e se não for bem isso?

E se não é de tão sós que se faz a multidão?

E se tuso isso é feito de mais vontade que obrigação?


E se fosse mais sorrisos que lamentos azuis?

Se for mais vermelho que dias nublados?

E se formos feitos de movimento? O que mantém todos nós parados?

P&B

Sim, amanheceu e isso não está muito claro.

Você poderia esclarecer meu dia

Pintar de cor e alforria

A prisão dos sonhos meus.


Eu bem queria entender

O que chamou tua atenção

Era amor ou era atração

Era magia ou era de Deus?


Fala com força e clareza

Pensando melhor não pensa

Não vai fazer diferença

Deixa pra lá o que aconteceu


Preto sem branco, vice-versa

Você não esta mais em mim

Pensando bem melhor assim

Deixa levar o que nunca foi meu

quarta-feira, 10 de junho de 2009

Divagações atuais

Por mais de uma vez divaguei a cerca de meu rumo.

O que eu devo fazer.

Me contaram que para as teorias sociais contemporâneas a depressão é fruto da falta de perspectiva.

Engraçado é que meses antes eu cheguei essa conclusão por experiência própria...

Mas então se o grande mal do nosso tempo é a tal depressão, decorrente da insegurança conquistada ao elevarmos a liberdade a máxima potência, o que podemos querer?

Na sociedade disciplinar o indivíduo goza de segurança, ao preço da liberdade que fique bem claro.

Estaríamos dispostos a pagá-lo?

Estaria esta questão correta?

Adiantaria pensar nisto, já que os novos tempos passam por mudanças nunca vistas?

Na era das perguntas sem respostas, ou de cem respostas no mínimo!

A grande impressão que tenho é que fica tudo no ar.

Que não adianta muito pensar no que foi ou no que terá sido na perspectiva da ação.

Entender é bom, saber é válido, mas as regras não se aplicam ao novo.

E assim, como na teoria do caos o padrão é tão complexo que beira a confusão completa à nossos olhos destreinados.

À mim, reles mortal, me resigno ao que a pós modernidade me destinou: saber o que é melhor ao menos para mim.

Então prefiro observar.

Mas minha cura reside no riso.

Simplesmente no riso simples.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Sonhos...

Sonhos coloridos são caros...
Porque são difíceis de se achar.
Quase ninguém sonha colorido.
Hoje em dia, quase ninguém sonha.

Mas, QUASE, é meio sim
Talvez menos do que é meio não.
E mesmo assim meio triste por ser maioria não.
Assegura seu mínimo sim.
Guardado como tesouro.
Como pérolas de otimismo dos desacertos certos.
O quase guarda o POSSÍVEL.
Que é toda a esperança de quem ainda crê.

terça-feira, 2 de junho de 2009

O mesmo

É, cada um tem que seguir seu caminho!
Bah! Que lugar comum!
Frases feitas!

Quando acaba o amor, não sobre muito mais que isso.
Frases feitas. Qualquer coisa que alguém já tenha dito quando uma parte do coração foi levada para o lado oposto.
Ventanias...
Elas têm o poder de levar as coisas para longe.
Mas duram tanto quanto a intensidade.
Tudo que é intenso se consome mais rápido.
Grande novidade essa também...

Mas ainda assim, elas são menos perigosas que as calmarias.
Elas não lhe deixam sair.
Ou aos poucos te levam sem que você perceba.
Elas têm o poder de levar mais longe ainda.
Mas também duram tanto quanto a intensidade.
Se estendem por milênios intermináveis

E te levam para os lugares comuns.
Onde todas as pessoas passam.
Sem fazer a menor diferença.
Sem se importar com as marés que você viveu.

Frases feitas, lugares comuns...

Assim como os desabafos em escarlate dessa janela dos meus discursos simples.