terça-feira, 25 de agosto de 2009

Filme Antigo

Viu mais uma vez aquela velha história dançando na luz do projetor. Era como se a sua memória fosse diretamente projetada naquela parede. Que parecia já ter as marcas reais dos gols que as crianças faziam impressas à lama com a identidade da bola.

Aquela era uma forma de esquecer o que passou no verão seguinte. Quando as ondas levaram seu futuro craque. Ele nem queria ser nadador, mas adorava a água.
Um dia sem aviso, o mar veio buscar o que nunca trouxe de volta.

Os olhos dele ficaram na jabuticabeira do quintal, junto com o sorriso no balanço e as gargalhadas na casa da árvore.
Ele estaria ali para sempre, mas o mar vinha buscar cada pedacinho, um de cada vez.
Até que não sobrasse mais nenhum do menino, nem da mãe que alimentava a maré com lágrimas mais densas que o próprio mar...

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

La pluie

Assim que amanheceu aquele dia, o pior aconteceu.
Não que fosse muito simples viver de brisa no estômago.
Mas a chuva, que não mata a sede, derrete a moradia.
Ofende os olhos, fere o orgulho, humilha o âmago.

As gotas molhavam o rosto cansado, sofrido, exausto.
A única água à molhar as rugas, sem lágrimas nem banho.
Ação escorrendo pelos dedos, um grito pelo canto da boca.
Êxodo de piolhos mal nutridos “comendo poeira” de sonho.

O vento aos urros, levava embora o resto do teto frágil.
Ao menos tapava as estrelas num aconchego grosseiro e vil.
Arrastando pela rua a última foto, que guardava lembranças.

Privado de tudo, até mesmo do desespero que às vezes alivia.
Andou devagar, buscando, no silêncio de uma prece vazia,
Em outro papelão, o que nunca chegou a ser uma esperança.